segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

R33 A ferrovia

Um caminho longo demais...
Ontem, depois de começar a caminhar novamente em percursos longos pude me sentir feliz. Experimentei sol e chuva, mas acima de tudo a certeza de estar no caminho que iniciei há algum tempo, do sol e do aço. Efeitos começam a aparecer sobre o corpo aos poucos exatamente como deixou registrado em seu memorável livro de reflexões, Yukio Mishima. Esse admirável escritor japonês em "Sol e Aço" uma de suas melhores obras fala de coisas do corpo e do espírito.
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E descreve de forma candente como o aço, parecendo obedecer a uma espécie de lei de equilíbrio natural, passa aos poucos para o corpo a força que está contida nele e modela o corpo que dele usa. Descobri mais por esses dias. Não só modela o corpo, como modela também o espírito. Tivesse eu levado as palavras desse pequeno livro para a prática há anos atrás e com certeza muitas coisas da vida não teriam me abatido como me abateram.
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De sorte que há alguns meses, passando em frente da floresta que sempre vejo, iniciei passo a passo o caminho para vivenciar tudo isso. Nem bem posso dizer que tenha vivência nesse caminho e já senti que a emoção que por vezes toma conta de mim com um corpo que se refaz a cada dia é algo a desejar e ao mesmo tempo a temer, ou acautelar-se com as coisas que ela nos leva a fazer e quando vemos, está feito. Se o começo é assim, tímido e ao mesmo tempo turbulento, penso no que será no momento em que o corpo atingir a plena vitalidade de trabalho e luta por causa disso. O próprio Mishima pagou com a vida por isso.
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Paro a caminhada que iniciei horas antes. Me lembro de na saída ter visto bem longe a quilômetros de distância a fábrica que fica no caminho, a alegria de recomeçar as caminhadas, saber que antes de me assustar, a distância me convida. E vou em frente. Por dentro uma sensação quase de êxtase.
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Em certo trecho da caminhada, percebo que pouco ligo para o tempo, mal sinto o cansaço. A cada caminhada, me sinto melhor. Continuo e alterno sol e chuva pelo caminho. Olho agora a fábrica, quilômetros atrás. Paro aqui perto da ferrovia que conheço há anos, vejo seus trilhos desaparecendo no horizonte e o sol brilhando sobre o aço dos trilhos e me parece que faço um caminho assim. Só não sei onde vai terminar, mas é contagiante.
E pensar que um pequeno livro, de memórias e reflexões desperta tantos sentimentos. Guardei-o por anos, por vezes relendo algumas das impressões deixadas pelo escritor.
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Se esse tão pouco já dá essa sensação, espero que possa viver muito mais disso ainda. Os trilhos, sol e aço, brilhando e se perdendo no horizonte, agora, ao invés de trazerem a sensação de dúvida pelo fim do caminho, trazem a esperança de que o caminho seja interminável.

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